segunda-feira, 1 de junho de 2009

London on my mind


Era um sonho. Um lugar mítico, um éden pessoal. Muito pessoal, por lá minha imaginação fértil de criança/adolescente vagou por horas, dias, meses e anos sem fim. Energizam-me positivamente as memórias de andar por suas ruas, vielas, becos, sempre em busca de um pedacinho de um paraíso particular e muito cinestésico.
Eu sabia que tinha que ir, como um ser sob o efeito de hipnose, que esticando os braços, arrisca passos adiante em busca de seu "WA" particular. Buscava mais que tudo, um encontro comigo mesmo. Um espelho cadeiloscópico de minha alma multifacetada, complexa, confusa.Tinha encontros marcados. Com Joyce, Dickens, Christie, Doyle, Greene,Hitchcock, Pessoa, Mann e muitos outros. As buscas todas convergiam para um ponto geográfico, misto de mapa mental, difusas idéias sobrepostas e pré-concebidas e o grande e fascinante elemento do desconhecido.
Londres. Meu destino desde sempre. A cidade que eu encontrei era a subterrânea terra dos
pequeninos brasileiros, ingênuos e um tanto otimistas demais, vivendo de bicos, de
sub-empregos, de esperanças e a idéia muito arraigada de "que tudo vai dar certo no final".
Èramos relativamente poucos naquele comecinho da década de 80, muitos sem noção do que
deixavam para trás, consumidos íntimamente por aquela sensação de saudades, da falta de
coisas que nem háviamos notado antes e criando um elo impossível entre nós, de origens
sociais e geográficas muito diferentes, unidos por uma língua e um anseio qualquer comum.
Olhava em volta e havia o frio, um pouco de "fog", a característica e romântica neblina do
lugar, prédios antigos, iguais e alinhados uns ao lado dos outros, como uma linha de montagem
doida de casas de tijolinhos marrons. Havia os pubs, estranhos lugares sombrios e com gente
tatuada e muito diferente. A comida era horrível, sem gosto, sem tempero, cara e diferente. Purê de batatas, com vagem e um pedaço de rosbife constituíam um banquete! Os parques eram paraísos para leitores com tempo e amantes em geral. As ruas de vitrines incríveis, Oxford, Regent's Street eram mecas de consumo muito acima de minhas posses, mas valiam pelo visual e pela atmosfera. Os museus eram oásis que valiam muito a pena serem visitados e explorados. A cada esquina uma pequena surpresa. Mews = ruas estreitas, em geral paralelas ás ruas mais importantes e que num passado nem tão distante assim eram as vielas por onde os cavalos circulavam e onde ficavam as cocheiras, hoje transformadas em charmosos endereços no centro de descolados abonados. A King's Road no verão (curto, curtíssimo verão), com seu incrível desfile de mulheres bonitas, charmosas e totalmente desencanadas. Gente do cinema, do jet set, circulando normalmente entre nós os meros quase-mortais (naquela época acreditávamos sermos eternos, intocáveis, inatingíveis....as cicatrizes subsequentes nos trazem de volta à dura
realidade).
Os lindos ônibus double-decker, os lugares para turistas, o Kews Gardens, espécie de jardim
botànico de lá. Speakers Corner, Green Park, Piccadilly Circus, Earl's Court e seus indianos
e australianos e uma atmosfera "cool". Nottingh Hill, Saint Johns Wood (e um endereço
querido por quatro anos, Abbey Road - sim, aquela dos Beatles). Uma moto e a liberdade. O
trânsito doido para ser vencido, um brasileirinho importado diretamente do interior mais
caipira do Brasil, observando, boca aberta, admirado e decidido a gostar de tudo aquilo. Gostar, no imperativo, sem opções.
Gente nova, histórias de vida diferentes, mais brasileiros e mais cheiro de Brasil de quando
aqui me encontrava. A saudade magnifica as sensações, as memórias, os cheiros, as
minúcias das pequenas lembranças.
Um crescimento. Um espelho. Um encontro comigo mesmo. Mil encontros. O eco de uma alma em busca de um significado. Hoje acordei saudoso de Londres. Hoje um pedacinho de mim caminha por May fair. Outro se diverte vendo os animais do zoológico de Regents Park. Outro se esbalda em uma das livrarias incríveis que a cidade oferece. Um bom café da manhã, com
ovos mexidos, sausicha, bacon, feijão com molho de tomate, torradas, suco de laranja. Papéis
de parede cafonas. Londres "is on my mind" today!

Um comentário:

Antonio Manoel disse...

Cezar

Realmente muito legal, uma passagem da sua vida que não se pode esquecer de maneira nenhuma.

Abraço
Manoel