terça-feira, 20 de outubro de 2020

Uma foto que desperta recordações!


 Para aqueles da minha geração, que acompanharam de perto a evolução do Emerson Fittipaldi é inevitável associá-lo à imagem da belíssima Lotus 72D negra nas cores da John Player Special, que tantas vitórias e tantas alegrias nos proporcionou. Mas estávamos (eu, pelo menos, estava) ainda em estado de choque, de êxtase: "como pode um garoto dentuço, do Brasil (onde???) ser o novo rei da velocidade? Veio 73 e as pilantragens de Colin Chapman que claramente não valorizava seu campeão de suiças proeminentes, privilegiando o velocíssimo sueco voador Ronnie Peterson. Mas, este não saberia acertar a diferença de alinhamento entre um piano e um bólido de Formula 1, ou seja, dirigia rápido se o carro correspondesse, ao contrário iria comer borracha, entrar de lado nas curvas, mas isso não traz ponto e muito menos vitórias. Recuperados dos susto, soubemos que "nosso" Rato iria para a promissora equipe McLaren (até então não havia vencido nenhum título), e além disso atraía o patrocínio milionário da marca de cigarros Marlboro. O grafismo, inconfundível, perdurou por décadas na mesma escuderia, até a era pós Senna. Agora éramos maduros e podíamos torcer por nosso campeão, já firmemente estabelecido no panteão dos grandes. E que carro lindo! Enfrentando as poderosas e velozes Ferraris de Lauda e do inconstante Regazzoni, Emerson papou mais um título com a cabeça e uma habilidade única em fazer a equipe unir-se a seu lado. Estávamos a caminho de outros títulos, outros campeões, mas o primeiro amor a gente nunca esquece! 

domingo, 4 de outubro de 2020

A efémeride importante: 50 anos da vitória do Emerson em Watkins Glenn!





 Mergulhando fundo no túnel das lembranças mais distantes, semicerro os olhos e visualizo um garotinho magro, franzino até, de exatos dez anos de idade. Coleciona figurinhas, lê muitos livros de aventuras ( Mark Twain e seu incrível As aventuras de Tom Sawyer; O Conde de Montecristo do Dumas são alguns que a enferrujada memória resgata daquela época). Lá fora o Brasil vivia o tão propalado “milagre econômico”, mas isso não era preocupação para um menino tão novo, cujos olhos em êxtase começavam a enxergar as coisas que o encantariam nas décadas seguintes: motos, carros, aviões, garotas (claro) e as muitas possiblidades que uma vida em seu prólogo promete.

1970 foi um ano marcante para muitos brasileiros: ganhamos com sobras a Copa do Mundo no México, com uma seleção inesquecível, forrada de craques do quilate de Gerson, Clodoaldo, Rivelino, Jairzinho, Tostão, Carlos Alberto, Edu e o gênio Pelé. Ainda na precária TV em preto e branco fomos vencendo jogo após jogo até aquela apoteótica final contra a Itália onde os quatro a um não deixaram dúvidas: éramos os melhores! Logo em seguida, vô Bernardo, espanhol bonachão e sempre com um cigarro de palha pendurado nos lábios me presenteou com minha primeira bicicleta “grande” : uma Monareta Olé70!, com a qual tive inúmeras aventuras ao longo dos anos seguintes.
Eu já era diferente: ao hegemônico futebol, preferia de longe as corridas de carros, sem jamais ter visto uma pessoalmente, ou mesmo pela TV. No máximo, haviam uns filmes antigos de velhas corridas em Indianápolis que algum obscuro programa de esportes passava esporadicamente, ressaltando, é claro, os acidentes quase sempre espetaculares. Mas, meu saudoso pai comprava as indefectíveis Autoesporte e Quatro Rodas, que eu, aos 10 anos já degustava de capa a capa. Eu sabia, que o Emerson Fittipaldi (ele é nosso parente, dizia o pai) já havia estreado na Formula 1 pela famosa equipe Lotus, no Grande Prêmio da Inglaterra. Sabia também que ele já havia pontuado (em 4° lugar) em sua segunda participação na Alemanha. Sabia sobretudo da tristeza da morte do austríaco Jochen Rindt o virtual e eventual campeão daquela temporada nos treinos do Grande Prêmio italiano em Monza, onde o próprio Emerson havia sofrido grave acidente nos treinos.
Era um domingo. A gente não acompanhava as corridas ao vivo, nem no rádio. Não no interior. Não na minha casa. Domingo era dia de ópera e macarrão. Eu adorava a ambos e meu irmão Enzo se escondia de meu pai que nos “obrigava” a gostar de ópera. Depois do almoço meu pai tinha um radinho de pilhas e ele ficava fuçando no dial das A M s da vida buscando por notícias (sempre foi ávido por informações). Ele me chamou e falou: Cezar Augusto....você não vai acreditar! Eu, ansioso por saber em que não acreditar esperei. – O Emerson ganhou a corrida! – Que corrida, pai? – O Grande Prêmio dos Estados Unidos, justamente o que paga o maior prêmio!
Para um menino de 10 anos era uma coisa grande, mas não soube, obviamente, naquele momento dimensionar o feito. Fiquei feliz, muito feliz. E ansioso para, dali a vinte, quiçá trinta dias conferir nas páginas da Autoesporte os detalhes da corrida. Fecho novamente os olhos e vejo aquele garotinho que mal compreendia o mundo. Percebo que o adulto que ele se tornou continua a pouco entender certas coisas. Mas algo ele sabe: temos que valorizar as coisas boas, as marcas de alegria que pontuam nosso caminho e, principalmente, cultivar nossas relações com amor e carinho. Valeu pai, valeu Emerson!
OBS: depois do caminho aberto pelo Emerson, tivemos mais de 30 pilotos brasileiros na Formula 1. Acompanhei a carreira de cada um deles, alguns conheci pessoalmente. Dois desses caras se eternizaram nas estatísticas e em nossos corações: Nelson Piquet e Ayrton Senna, ambos tricampeões, após o bicampeonato do próprio Emerson. Mas a primeira vitória, ainda que obscura na memória de um garotinho que hoje se hospeda no corpo de um senhor grisalho e com sobrepeso, essa jamais será esquecida!