sábado, 4 de abril de 2009

MINHAS REMINISCÊNCIAS PESSOAIS (4)


Estávamos portanto em fins de 1977. Grandes categorias, grids cheios, o velho e glorioso Interlagos era uma festa. Alguns anos antes tivemos categorias de esporte-protótipos, com a classe mais rápida, acho que Divisão 3, com os enormes Avallone (lembro-me bem de Arthur Bragantini, um verdadeiro bota) e na Divisão até 2 litros, os Polar, Manta, Heve. Vários pilotos bons corriam nessa época, alguns tinham até fã-clubes, os torcedores conheciam os detalhes técnicos e olha, que a Rede Globo nem sabia que havia automobilismo doméstico por aqui.
Começo de 1978, minha vidinha continuava a mesma: estudava, trabalhava esporadicamente, e vivia sonhando dia e noite com automobilismo. Eu vivia na cidade em que nasci, Ourinhos, a quase 400 km de São Paulo, longe de tudo e de todos, ás vezes o pessoal organizava uma corridinha de Kart por lá, não tínhamos grana para participar, meus amigos e eu, mas seguíamos toda a movimentação.
Naquele ano a Formula 1 iria realizar a sua etapa brasileira no novo autódromo de Jacarepaguá no Rio de Janeiro, mais distante ainda. Apesar de ter ido várias vezes a Interlagos assistir provas domésticas, eu ainda não tinha tido a oportunidade de ver um carro de Formula 1 em ação, na pista. Havia visto, claro, em salões do Automóvel, exposições, etc, mas não na pista. Combinei com meu amigo Mané português, que era ponta firme e não me deixava na mão, meses antes. Economizamos tudo o que podíamos e na terça feira antes da corrida, saímos de Ourinhos de carona de um velho caminhão FNM, cuja velocidade de cruzeiro raramente excedia 50 km por hora. Mas em cavalo dado, não se olha o dente, portanto....
Após mais de dez horas de viagem, o motorista nos despejou em algum lugar perto do centro, rumamos então para a rodoviária da Luz e tomamos um ônibus para o Rio. Ambos com cerca de 18 anos (Mané um pouco mais velho, mas continua a ter 18 anos hoje, rs), cansados, com fome, vontade de tomar um banho, enfim....Ao chegar a rodoviária do Rio, bem cedinho, fomo á uma lanchonete e pedimos uma média, coisa de paulista. Puxei conversa com uma mulher muito simpática que nos explicou como fazer para chegar ao autódromo, na realidade muito longe dali.
Depois de mil peripécias, trocas de ônibus, informações erradas e etc, finalmente chegamos ás cercanias do autódromo, naquela época um lugar deserto e muito longe da zona sul. Caminhamos com nossas desajeitadas mochilas em direção ao muro do autódromo quando de repente, eu jamais vou me esquecer daquele instante, eu ouvi o ronco de um motor de Formula 1 pela primeira vez. Era um zumbido, que vinha num crescendo e a mim parecia a mais linda das melodias executada pela orquestra mais competente do mundo! Corri feito um doido, daquelas cenas de filme, e ao chegar perto da muralha, não hesitamos, apoiando-nos um no outro, pulamos para dentro do autódromo, que portão que nada! O carro solitário que fazia algum ajuste naquele começo de manhã era o Surtees branco e laranja de um de meus ídolos Vittoria Brambilla, com o patrocínio costumeiro da Beta. O Carro vinha falhando na reta, ele reduzia, e nós dois, intrépidos caipiras, com mochilas cheias de tranqueirias e mantimentos, nem ao menos portávamos uma máquina de fotografia. Nos aproximamos bastante, e de repente, outro trovão: uma linda Ligier Matra azul rasgando a reta, sem falhar e com aquele zumbido característico que encantava a todos. Depois disso, foi festa, mas eu ansiava em ver o Copersucar amarelo de meu ídolo-mor, Emerson, e não demorou para que meu desejo fosse atendido. Fomos caminhando ao lado da pista como quem não quer nada e se me recordo bem, naquela noite dormimos os dois no autódromo mesmo, nas arquibancadas. Me lembro que no dia seguinte, imundos, com fome, decidimos procurar um hotel, mas não queríamos ir muito longe, portanto chegamos os dois caipiras, a pé num motelzinho de terceira classe. O preço era razoável, e quando falamos para o atendente que sim, queríamos o quarto, ele nos olhou de alto a baixo, avaliando talvez quais papéis iríamos desempenhar respectivamente naquele noite.....rs.....foi divertido, mas o "maledeto" do portuga ronca demais. A viagem foi tão excitante, vimos tantas coisas magníficas, passeamos pelos boxes, pedimos autógrafos, de repente estávamos a dois passos de Carlos Reutemann, de Niki Lauda, de James Hunt (outro piloto que eu sempre gostei), do próprio Emerson, sempre muito assediado, que decidimos voltar para casa no sábado mesmo, antes da prova. Já tínhamos atingido nosso objetivo de ver os carros e os pilotos de perto, e a prova seria melhor vista pela TV mesmo. No dia da corrida Emerson chegou num memorável segundo lugar atrás da Ferrari de Reutemann, o melhor resultado da história da equipe. Eu não estava lá, mas poderia ter estado, optei por voltar. Não gastei um centavo com ingressos, e me diverti muito!

4 comentários:

Bruno disse...

Já está se tornando uma tradição, ler suas lembranças e ir dormir. Claro, além de correr na Europa, vc também foi acompanhar, ou não?

Boa história, eu nunca vi um Fórmula 1 de perto, mas esse é um dos sonhos que vou realizar com meu pai ainda.

Estou notando, sempre você coloca uma passagem expondo seu lado galanteador...rsrs. Brincadeiras a parte, o blog tá muito bom.

Nelsinho em oitavo? essa eu não acredito muito...rsrs. Ainda mais depois da entrevista que ouvi dele no Tazio.
Abraços.

Cezar Fittipaldi disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Cezar Fittipaldi disse...

Olive...
Thanks a lot for following it, I do it for fun and sharing this fun is very nice.

Bruno, tenho que tomar cuidado e não deixar esse lado galanteador aflorar muito, afinal sou um senhor casado, rs.....grato, amigo.

Paula Peixoto disse...

Tal como o Bruno Santos eu nunca vi uma corrida de F1 ao vivo...confesso q sera o meu maior sonho de vida, um dia o realizarei, embora ache q a verdadeira F1 ja la vai a muitos anos...

a verdadeira F1 dos anos 70 :) a melhor decada pra mim.